Escritos de Rafael Perfeito

terça-feira, 27 de agosto de 2013

Eu vejo flores em você



A versão tupiniquim do Walter White, muito menos mau caráter e empreendedora e muito mais simpática e festiva, foi presa em sua casa por ter um "pequeno" cultivo de Cannabis. Quando estava sendo almejado ou melhor dizendo, algemado, o cabra não conseguiu segurar o riso. Não pela situação, ainda grave, mas porque tinha acabado de fumar uma bagana enorme. Lá de dentro do camburão ainda dava sorrisos, o Walter White sem cavanhaque e de longos dreads.

Ele deixou um bilhete ao lado da plantação: "Nunca fiz mal a ninguém. Sou um grower, bicho. Além do mais se a Aracel Celulose refloresta, eu também tô reflorestando! O governo devia me dar créditos de carbono! Legalize Jah!".

Enquanto isso os médicos cubanos, em sua maioria negros, estão sendo vaiados por nossas colegas compatriotas e brancas - em sua maioria - por virem se meter "onde não foram chamados" e para onde ninguém quer ser chamado.

Pois é...

seja na questão da criminalização da maconha, na vaia aos médicos cubanos ou nos benefícios malucos pras multinacionais, o Brasil tá precisando é de

REFLORESTAR SUAS IDEIAS.


quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Sonhos I



Hoje eu sonhei que passados alguns dias do pretenso fim do mundo eu me encontrava em um convento no Iraque, provavelmente mais por cagaço do que por convicções religiosas. Assistindo a um seminário ministrado por duas mulheres, tive um chilique quando uma delas afirmou que Jesus Cristo tinha a barba ruiva. Levantei-me, protestei aos berros:

_ Jesus era da cor do Bin Laden!! DA COR DO BIN LADEN!!

Ignorando os avisos de um amigo de que no convento estaríamos a salvo,  saí do palácio e fui caminhar até o mar, seguindo o Arvand Rud, rio formado pelo Tigre e Eufrates. Após vencer um portão de arames quebrados, segui por alguns metros e molhei meus pés nágua. Mais relaxado, observando o céu róseo, olho para o lado e vejo um leão. Pior: ele também me vê. Corri em campo aberto até ser alcançado. Já sem esperanças, tête à tête com o animal, vejo um ex aluno meu, da Católica, desvencilhar-se do pai apavorado e correr por trás da besta.

O garoto, gordinho, de uns 13 anos, pega uma pedra e joga no bicho. Este se vira para ver a ameaça. Ruge para o moleque, dando as costas para mim. É o meu momento de jogar outra pedra.

O leão fica nessa, virando pra mim, virando pro garoto, recebendo pedras, até que, de saco cheio, vai embora pela esquerda.

Emocionado eu corro até o garoto, o pego pelos braços e, olhando para ele e para o pai incrédulo, berro alucinado:

_ Eu serei eternamente grato!!! ETERNAMENTE GRATO!!!!

Neste exato momento...

o mundo acaba.


terça-feira, 13 de agosto de 2013

Conchinha

Imagem de Raymond de Sá http://usinacor.blogspot.com.br/


As maravilhas de um começo de namoro são muitas. Paixão é bão dimais!
É um tal de trepar toda noite até a exaustão.

_ Pô, hoje a gente podia tomar um vinhozinho e fazer amor a noite inteira... que acha?
_ Vamos fumar um e trepar pra ver como é que é?
_ Amorzinho... tem doce de leite e chantilly de sobremesa...
_ Será que hoje a gente consegue assistir a um filme sem parar na metade?

Não importa a ordem... fato é que depois daquelas primeiras semanas, quando o sexo é tão intenso e tudo o que conseguimos, pós coito, é desabar na cama encharcada, soltar um cansado "boa noite" - carregado de significados e ternuras mil - e, antes de cair num sono pesado, cada um pro seu lado, esticar a perna ou a mão para tocar de leve alguma parte do corpo do parceiro...

... após essas primeiras semanas começa o tal de "dormir de conchinha". Uma coxa sob a outra, os dedinhos dos pés entrelaçados. O pé da menina se esfregando na panturrilha cabeluda do garoto. A cabeça dela apoiada no seu ombro. São mil maneiras.

 TODAS DESCONFORTÁVEIS.

Quem está casado há muito tempo nem irá se lembrar, ou por dormir em quartos separados, camas longínquas, lados bem opostos, ou por ambos corpos se aninharem tão bem que já estão até tortos, fora do prumo original...

Mas depois do casal cismar em dormir de conchinha, começam os problemas. Ao acordar.
Haja mau jeito, haja dorflex.
Haja torcicolo, haja musculare.
Quem passou muito tempo sem namorar e engatou um namoro recente, ou acabou de trocar de parceiro, vai saber do que estou falando. Os corpos demooooram para se moldar. As articulações sofrem!

Eu, por exemplo, não fui trabalhar hoje. O médico me deu 3 dias de atestado. Torcicolo e muita, muita dor nos ombros. Até a base da coluna estava doendo.

É que eu vi a judiação pela qual os gansinhos passam... e troquei meus dois travesseiros de penas por aqueles da Nasa.



sábado, 10 de agosto de 2013

Tradição, Família e Hipocrisia


Mandou brasa em mais uma carreirinha e passou a nota de cem reais para a prostituta enquanto jogava a cabeça pra trás e contraia a mandíbula. Ao ver a deslumbrada menina encurvada sobre seu colo com o canudinho, ele desceu sua mão por aquelas costas brancas, enfiando o dedo médio entre as nádegas já vermelhas.
_Você já tem bunda de mulher, hein meu bebê? - E enfiou o dedo ainda mais.
_ Curioso você falar em bebê. Descobri ontem que estou grávida de três meses! - Respondeu a garota de 16 anos, abrindo e fechando a boca após mandar uma carreirinha em duas etapas.
Neste momento uma centelha de remorso acendeu nos olhos do homem. Sua mão deixou o vale lambrecado feminino num gesto instintivo e pegou a nota de cem reais que lhe era ofertada de volta.
Levou o canudinho ao nariz, ainda um tanto perturbado.
Ao sentir o cheiro proveniente de seu dedo, o sorriso voltou imediatamente à face do pastor Márcio Alegriano, enquanto o pó continuava a percorrer-lhe os caminhos do peito e da consciência.


quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Orquídea Negra


Há duas semanas ela me deu umas begônias. Com um sorriso fabricado, sentou-se à mesa da cozinha, num banquinho vermelho, e terminou tudo. Me deu begônias e terminou tudo.

Hoje ela resolveu me fazer uma visita.

"Meu Deus, as begônias que eu te dei!"

Foi o que saiu de sua boca ao ver o cadáver begônio em cima da geladeira, as cores pútridas de aspecto sepulcral tristemente caídas do pote onde, semanas antes, fulguravam esbeltas.

_Lamento muito! Regá-las seria agir como o negro capitão do mato
ajudando a caçar crioulo fugido!
Seria o judeu a vigiar seus semelhantes nos guetos
para as autoridades nazistas.
Alimentá-las representaria, para mim, ser o carrasco de mim mesmo,
tentando cobrir o rosto com um capuz diante do espelho!!


Isso foi o que gritei a ela, da porta da cozinha, ecoando pelas escadas,
enquanto o elevador a carregava para baixo.

Mas a verdade é que não quis admitir o total esquecimento de ter colocado as begônias em cima da geladeira.
Alguém deveria te-la avisado que sempre preferi orquídeas.
Negras.
Vou acender um cigarro...